Sob o olhar da Mãe
por Patrizia Bergamaschi
Talvez o maior desafio para os artistas de todos os tempos seja o retrato de Jesus. Como captar o não visto e expressar, pela fé ou pela própria experiência mística, as feições do “mais belo dos filhos do homem”? Se, de um lado, seu rosto deve ser plenamente humano, de outro, deve transfigurar sua divindade revelada. Assim, percorrem os pintores as telas e as próprias almas para desvelar o Cristo em algumas fases de sua vida, acompanhando o relato do Evangelho, mas presos ao tempo em que vivem, às circunstâncias sociais e até mesmo aos estilos que se destacam.
"Mater dolorosa", de Dieric Bouts: século 15. Vestida como uma mulher da época do pintor; a Mãe desfaz-se em lágrimas. Há um destaque para as belas mãos que evocam sua atitude interior: súplica e adoração |
Multiplicam-se as buscas de retratar o Filho de Deus, como se, por um especial favor divino, algum artista, num raro momento de favorecimento ou de êxtase espiritual, pudesse conseguir flagrar um pálido vislumbre de seus olhos. Nunca se chegou a uma imagem ideal, como a provar que Deus se reparte de todas as formas e em todas as culturas. Mas sondam também a Mãe. Talvez, de uma mulher, totalmente humana e frágil, seja possível captar o fulcro da divindade encarnada.
Talvez, numa mulher do povo ou numa grande dama, numa menina cândida ou numa mulher sofredora, estejam os traços da Virgem. Talvez, nos gestos das mães de todos os continentes e povos, estejam reunidos – como singular tesouro – os sentimentos da Mãe do Salvador. Assim, percorrem os pintores as telas e as próprias almas para encontrar a essência do feminino, a pureza sempre virginal da maternidade, o seguro regaço psicológico.
Maria torna-se ponte a nos unir ao divino, ao mistério. Sob seu olhar, em todas as telas, é a nós mesmos que vemos, transformados em seus filhos, abrigados em seu peito, sustentados em seus braços. Mérito de geniais artistas ou de legítima inspiração mística... Nas linhas delineadas pelos homens, nas cores que eles imitam da natureza, um sopro do Espírito se ouve e nos consola com a beleza passageira a evocar a eterna.
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