
D. José C. Velasco
Os ícones (do grego eikon = imagem, retrato, semelhança), quadros pintados sobre a madeira com a utilização de matérias naturais, ricos de teologia e de catequese bíblica, têm sua origem milenar no mundo grego e russo. A gênese desta verdadeira arte sacra remonta aos séculos 4 e 5, no primitivo cristianismo de Bizâncio, na cidade de Constantinopla (hoje Istambul, capital da Turquia) e sua história foi marcada por perseguições e martírios de monges pintores ou defensores, por parte do movimento iconoclasta que aconteceu entre 726 e 842, mas obteve seu triunfo na devoção do povo que nela encontrou os reflexos do sagrado.
Trata-se da típica arte sacra da Igreja Ortodoxa porque é canônica, isto é, existem regras fixas para reproduzir um ícone, como jejum, orações, conhecimento da Escritura, da Tradição, do Magistério, etc.
O que de fato é o ícone?
O ícone é uma imagem, mas nem toda imagem é um ícone. Este é muito mais que uma livre representação de um mistério, deixada por conta da imaginação do artista; não se trata daquele espiritual fruto da sensibilidade, das divagações subjetivas e dos insípidos gostos pouco claros; não é um retrato no sentido moderno, secularizado e pouco transcendente. Ao contrário, sua linguagem é simples e visa somente à glorificação do mistério. De fato, o ícone é: celebração do mistério de nossa salvação - Encarnação, Morte e Ressurreição - por isso, instrução dos fiéis.
Finalidades do ícone
A iconografia cristã, por sua natureza, é semelhante a uma escola de oração e purificação interior, que tem por objetivo favorecer um encontro sempre mais claro e sincero com Jesus e sua Igreja.
A técnica da pintura bizantina é somente o terreno onde se cultiva e se desenvolve o mistério de tal encontro. A missão do iconógrafo é aquela de tornar visível e tangível a "Verdadeira Beleza", escondida no mistério silencioso das escrituras. Nesse caminho, ele não está só, mas em companhia com uma inteira tradição de santos que o precedem e o ajudam no longo caminho de sua existência. Segundo a Igreja oriental, o iconógrafo é chamado a tornar sagrado tanto o conteúdo quanto a forma de sua pintura, por isso a obra que sai de suas mãos deve encontrar analogia nas Escrituras e na Tradição dos Santos Padres. Ou como disse o VII Concílio Ecumênico: "A ele cabe somente o aspecto técnico, porque toda a elaboração do ícone provém dos Santos Padres".
Quem é e como vive o iconógrafo
O dia do iconógrafo começa cedo: logo que levanta, faz o sinal da cruz e invoca a misericórdia e a sabedoria de Deus, ora fazendo uma meditação da Escritura, ora contemplando um ícone de Cristo ou da Virgem Maria. Antes de começar o sagrado trabalho de pintura, ele faz uma das orações próprias do iconógrafo, das quais a mais famosa é:
"Oh Divino Mestre,
Ardoroso artífice de toda a criação.
Ilumina o olhar do teu servo, guarda o
seu coração, rege e governa a sua mão
para que, dignamente e com perfeição,
possa representar a tua santa imagem.
Para a Glória, a Alegria e a Beleza da
Tua Santa Igreja ".
Ele deve ser responsável e fiel ao reproduzir um modelo ou ao criá-lo, conforme a Escritura, a Tradição e a Doutrina da Igreja. Como o sacerdote no Santo Oficio, assim também é o pintor de ícone ao transformar a divina Liturgia, por meio de cores, sobre a tábua. Em sua vida diária, deverá cultivar os valores mais altos, tais como a
humildade e a caridade, procurando de viver em paz e corretamente, evitando as conversas frívolas e as vaidades mundanas. Deverá jejuar e orar antes e durante o trabalho, seguindo as normas da
Igreja, pois somente se a sua fé for muito forte e a sua mente sempre vigilante na oração é que a sua obra poderá transmitir uma mensagem àqueles que a observarão.
Que tenha um bom diretor espiritual e um padre confessor para não cair no pecado da soberba, ao elevar muito alto a mente e o coração a Deus. Que siga a técnica pictórica dos grandes mestres iconógrafos (emulsão a ovo, terras, minerais, etc) da qual já foi comprovada a estabilidade, beleza e resistência ao longo dos séculos.
Ele nunca deverá esquecer que, com seu ícone, serve ao Senhor, comunicando e cantando sua glória.
O que o ícone diz aos homens do terceiro milênio?
Para individuar o Belo é preciso ir além do olhar, atingir a perfeita harmonia e, em última análise, que suscitar a oração. Dentro dessa linha, recordo a carta de João Paulo II aos artistas: "Este mundo no qual vivemos precisa da beleza, para não cair no desespero. A beleza, como a verdade, dá alegria ao coração dos homens e é fruto precioso que resiste ao desgaste do tempo, que une as gerações e as faz comunicar na admiração. (...) Nobre mistério aquele dos artistas, quando as suas obras são capazes de refletir, em qualquer modo, a infinita beleza de Deus e endereçar a Ele as mentes dos homens".
Infelizmente, nossa época está marcada por uma forte poluição visual, que não somente ilude, mas também confunde a mente e coração do homem. A Beleza é nome divino junto com a Verdade, mesmo se esquecida. A tríade dos valores: beleza, bondade e verdade vivem somente se em comum acordo. O Bem, se separado da Verdade e da Beleza, é somente um sentimento indefinido, um impulso privado de força; a Verdade abstrata é uma palavra vazia e a Beleza sem o Bem e a Verdade é somente um ídolo.
Quando um grande escritor desse século afirmou que somente a "beleza poderá salvar o mundo" , sem dúvida, disse a verdade, porque ela tem sua raiz na glória de Deus. A mensagem transmitida pelo ícone é e sempre será atual, porque diz respeito ao homem e ao divino, por isso sua singela beleza é revelação do Originário e, ao mesmo tempo, antecipação do Definitivo.
" A grandeza e a beleza das criaturas levam, por analogia, à contemplação de seu Autor" (Sb 13,5), " pois foi a própria fonte da beleza que as criou" (Sb 13,3).
O monge camaldolense, d. José C. Velasco, formado pela Escola Ecumênica de André Rublev, em Trento, abriu neste ano a primeira escola de pintura iconográfica bizantina no Brasil (pintura e meditação dos ícones).
A duração do curso, ministrado pelo monge, será de 23/6 a 02/7/ 2000 para, no máximo, 12 alunos. Em vista disso, as inscrições deverão ser feitas um mês antes.
Para maiores informações:
D. José C. Velasco
Mosteiro da Transfiguração
08701-970 - Mogi das Cruzes. SP
tel: 0XX-11-4790 4941
Comentários