O Papa Bento XVI publicou, no último dia 7 de julho, o Motu Proprio Summorum Pontificum , em que regulamenta a volta da forma antiga de se celebrar a Missa no rito latino.
Na verdade, ele explica na carta aos bispos que acompanha o documento, "o Missal publicado por Paulo VI obviamente é e permanece a Forma normal – a Forma ordinária – da Liturgia Eucarística. A última versão do Missale Romanum, anterior ao Concílio, que foi publicada sob a autoridade do Papa João XXIII em 1962 e utilizada durante o Concílio, poderá, por sua vez, ser usada como Forma extraordinária da Celebração Litúrgica.
Não é apropriado falar destas duas versões do Missal Romano como se fossem 'dois ritos'. Trata-se, antes, de um duplo uso do único e mesmo Rito".O polêmico teólogo Joseph Ratzinger, em diversos livros, já havia falado de suas impressões sobre o tema da reforma litúrgica. Refinado amante da cultura clássica, Ratzinger nunca aceitou bem a forma como alguns intérpretes do Concílio Vaticano II impuseram uma espécie de ditadura da modernização. Segundo ele, a rapidez com que se tratou de modificar tudo na Igreja a partir do Concílio soou como se a Igreja fosse meramente uma empresa "sob nova direção", que tivesse o poder de trocar um rito milenar por outro com a mesma mecanicidade com que se aposenta um funcionário velho da Cúria e se contrata outro, afinado com o "espírito conciliar". É bom que se recorde que Ratzinger foi um dos peritos que trabalharam nos bastidores do Concílio Vaticano II, e que foi um dos entusiastas dos movimentos bíblico, litúrgico e patrístico, que clamavam por mudanças.
Ele não é um saudosista; foi ele quem enviou ao Arcebispo francês Lefebvre a carta de excomunhão, por não se submeter à autoridade do Concílio. Porém, ele chama a atenção para o fato de a reforma litúrgica ter sido feita com um certo repúdio a coisas importantes na tradição católica. Hoje em dia parece um crime cantar na Missa uma parte em latim, soa como conservador seguir as rubricas litúrgicas sem invencionices.
Em muitas comunidades no Brasil, por exemplo, perderam-se o zelo, a reverência e o senso do mistério na Missa; há hinos inadequados, danças exageradas, adaptações mal feitas, práticas abusivas de inculturação com requinte de sincretismo religioso, abusos na quantidade de comentários e gestos corporais, excesso de símbolos e cartazes dão um tom por demais racionalista, ritos alternativos inventados se tornam quase lei. Muitas teorias falsamente católicas foram invadindo as pastorais litúrgicas, tais como o enfraquecimento do gesto de se ajoelhar para adorar o mistério eucarístico, e a idéia de que a Missa pode e deve ser instrumentalizada para se falar de tudo um pouco, com listas cada vez maiores de avisos, homenagens, mensagens de conscientização etc. Com essa atitude, Bento XVI sabe que está conseguindo atrair mais críticas a si. Estigmatizado pelo senso comum como retrógrado, saudosista da cristandade pré-ecumênica e anti-moderna, o Sumo Pontífice sabe também, contudo, que tem a missão de preservar com afinco as duas maiores riquezas da Igreja Católica: a integridade do "depósito da fé" transmitida pelos apóstolos e a unidade dos membros do Corpo de Cristo.
Se alguém tem que ser conservador na Igreja, esse alguém precisa ser o Papa. Agindo na Igreja universal como representante do Cristo Cabeça deste Corpo, ele está disposto a entrar na imensa lista de perseguidos, criticados e mesmo odiados, na lista dos papas que tiveram que conduzir a barca de Pedro durante as tempestades ao longo da história. Este início do terceiro milênio talvez seja a maior tempestade de todas até agora. (pe. Juliano Ribeiro Almeida).
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