O papa Francisco
concedeu uma entrevista ao jornal italiano “Corrierre della Sera”,
tratando de assuntos relevantes do seu primeiro ano de pontificado.
Desde a apresentação no balcão da Basílica de São Pedro, na noite de 13
de março de 2013, o Bispo de Roma lidou com diversos assuntos, tais como
a Nova Evangelização, a reforma da Cúria Romana, a família, os
escândalos de pedofilia e a pobreza na Igreja. Com perspicácia e bom
humor, o Santo Padre falou desses temas, comentando ainda sobre certa
“mitologia” criada em torno de sua imagem, e sobre suas relações com
Bento XVI.
Balanço do pontificado
“[“Balanços”] Eu os faço apenas a cada 15 dias, com o meu confessor.”
Relações com Bento XVI
“O papa Emérito não é
uma estátua em um museu. É uma instituição. Não estávamos acostumados.
Sessenta ou setenta anos, o bispo emérito não existia. Veio depois do
Concílio. Hoje, é uma instituição. A mesma coisa deve acontecer com o
papa Emérito. Bento XVI é o primeiro, e talvez haverá outros. Não
sabemos. Ele é discreto, humilde, não quer perturbar. Falamos a respeito
e decidimos juntos que seria melhor que ele visse pessoas, saísse e
participasse da vida da Igreja.
Uma vez, ele veio aqui para a bênção da estátua de São Miguel Arcanjo, depois ao almoço em Santa Marta, e, depois do Natal, eu lhe dirigi o convite de participar do Consistório, e ele aceitou. A sua sabedoria é um dom de Deus. Alguns gostariam que ele se retirasse para uma abadia beneditina longe do Vaticano. Eu pensei nos avós que, com a sua sabedoria, os seus conselhos, dão força à família e não merecem acabar em uma casa de repouso.”
Uma vez, ele veio aqui para a bênção da estátua de São Miguel Arcanjo, depois ao almoço em Santa Marta, e, depois do Natal, eu lhe dirigi o convite de participar do Consistório, e ele aceitou. A sua sabedoria é um dom de Deus. Alguns gostariam que ele se retirasse para uma abadia beneditina longe do Vaticano. Eu pensei nos avós que, com a sua sabedoria, os seus conselhos, dão força à família e não merecem acabar em uma casa de repouso.”
Modo de governo
“O Papa não está
sozinho no seu trabalho, porque está acompanhado e é aconselhado por
muitos. E seria um homem sozinho se decidisse sem ouvir ou fingindo
ouvir. Mas há um momento, quando se trata de decidir, de colocar uma
assinatura, em que ele está sozinho apenas com o seu senso de
responsabilidade.”
Projetos de mudança
“Em
março passado, eu não tinha nenhum projeto de mudança da Igreja. Eu não
esperava essa transferência de diocese, digamos assim. Comecei a
governar tentando colocar em prática
o que havia surgido no debate entre cardeais nas várias Congregações.
No meu modo de agir, espero que o Senhor me dê a inspiração. Dou-lhe um
exemplo. Falou-se do cuidado espiritual das pessoas que trabalham na
Cúria, e começaram a fazer retiros espirituais. Devia-se dar mais
importância aos Exercícios Espirituais anuais: todos têm o direito de
passar cinco dias em silêncio e meditação, enquanto antes, na Cúria,
ouviam-se três pregações por dia, e depois alguns continuavam
trabalhando.”
Imagem pública
“Eu gosto de estar entre as pessoas, junto com quem sofre, ir às paróquias. Não me agradam as interpretações ideológicas, uma certa mitologia do papa Francisco. Quando se diz, por exemplo, que ele sai de noite do Vaticano para ir dar de comer aos sem-teto na Via Ottaviano. Isso nunca me veio à mente. Sigmund Freud dizia, se não me engano, que em toda idealização há uma agressão. Pintar o Papa como uma espécie de super-homem, uma espécie de estrela, parece-me ofensivo. O Papa é um homem que ri, chora, dorme tranquilo e tem amigos, como todos. Uma pessoa normal.”
O Papa e o marxismo
“Nunca compartilhei a ideologia marxista, porque não é verdadeira, mas conheci muitas pessoas boas que professavam o marxismo.”
Escândalos e abusos
“Os casos de abuso
são terríveis, porque deixam feridas muito profundas. Bento XVI foi muito
corajoso e abriu um caminho. A Igreja, nesse caminho, fez muito. Talvez
mais do que todos. As estatísticas sobre o fenômeno da violência contra
as crianças são impressionantes, mas também mostram com clareza que a
grande maioria dos abusos ocorre no ambiente familiar e na vizinhança. A
Igreja Católica talvez seja a única instituição pública que se moveu
com transparência e responsabilidade. Ninguém fez mais. No entanto, a
Igreja é a única a ser atacada.”
Uniões civis homoafetivas
“O
matrimônio é entre um homem e uma mulher. Os Estados laicos querem
justificar as uniões civis para regular diversas situações de
convivência, impulsionados pela exigência de regular aspectos econômicos
entre as pessoas, como por exemplo assegurar a assistência de saúde.
Trata-se de pactos de convivência de várias naturezas, dos quais eu não
saberia elencar as diversas formas. É preciso ver os diversos casos e
avaliá-los na sua variedade.”
Jovens conectados falam sobre Francisco
Era
28 de fevereiro de 2013, uma segunda-feira de carnaval. “Acessei uma
rede social e a primeira mensagem que eu li foi: ‘Obrigado, Bento 16!’.
Pensei imediatamente: ‘Meu Deus, o Papa morreu!’. Para a minha maior
surpresa, ele tinha anunciado a sua renúncia”, recorda o jovem Lucas
Monteiro, de São Luís (MA).
Moisés
de Oliveira, de Brasília (DF), também soube da renúncia do Papa pelas
redes sociais.
“Achei um ato extraordinário, pois quaisquer que fossem os motivos – e naquele momento tudo parecia muito nebuloso –, requeria uma coragem imensa. Essa coragem, o desprendimento, a serenidade de Bento XVI, tudo isso me fez admirá-lo ainda mais.”
“Achei um ato extraordinário, pois quaisquer que fossem os motivos – e naquele momento tudo parecia muito nebuloso –, requeria uma coragem imensa. Essa coragem, o desprendimento, a serenidade de Bento XVI, tudo isso me fez admirá-lo ainda mais.”
De
início, Lucas sentiu “desesperança”, com a possibilidade de “que a
situação da Igreja estivesse tão ‘grave’, que nem o Papa tivesse
aguentado”.
Sentimento compartilhado por Rubens da Cruz, seminarista da Arquidiocese de São Paulo. Ele entraria no seminário propedêutico na semana seguinte ao do anúncio da renúncia. “A sensação de abandono e orfandade tomou conta de mim e me deixou inerte. Vou ingressar no seminário, para servir uma Igreja em que nem o Papa quis ficar”, lembra-se Rubens. Tanto Lucas quanto Rubens, após uma pausa de reflexão e oração, compreenderam melhor o ato de Bento XVI. “Era mais do que um abandonar a Igreja. Era um novo respiro, para que a Igreja pudesse sair daquele mar bravio e agitado”, concluiu Rubens.
Sentimento compartilhado por Rubens da Cruz, seminarista da Arquidiocese de São Paulo. Ele entraria no seminário propedêutico na semana seguinte ao do anúncio da renúncia. “A sensação de abandono e orfandade tomou conta de mim e me deixou inerte. Vou ingressar no seminário, para servir uma Igreja em que nem o Papa quis ficar”, lembra-se Rubens. Tanto Lucas quanto Rubens, após uma pausa de reflexão e oração, compreenderam melhor o ato de Bento XVI. “Era mais do que um abandonar a Igreja. Era um novo respiro, para que a Igreja pudesse sair daquele mar bravio e agitado”, concluiu Rubens.
O
período entre a renúncia de Bento e a eleição de Francisco foi
“estranho”. O Papa estava vivo, ativo, e a sede estava vacante. “Como
era possível?”, se questionava Lucas. Ao mesmo tempo, recorda o jovem
maranhense, “Bento 16 renunciou no período da Quaresma, um tempo de
jejum, oração e avaliação. Tempo em que somos convidados a viver o
período eremítico de Jesus, a caminhar com o mestre no deserto”. “E aí
eu entendo como essa renúncia foi feita em um período oportuno. A Igreja
já estava em oração, recolhimento, e, junto a isso, pudemos pedir ao
Espírito Santo um Papa que pudesse guiar esse rebanho.”
Além
disso, Lucas acredita que a eleição de um Papa vindo das Américas foi
“muito importante para a Igreja deste continente, principalmente, a meu
ver, para as vocações”. “Uma vocação daqui, que desenvolveu todo o seu
trabalho pastoral aqui do lado, em Buenos Aires, foi chamada ao Papado,
significa que há esse olhar da Igreja para as ‘periferias’, para fora da
Europa.”
Como
é “curioso” e se interessa pela História da Igreja e pelos seus
bastidores, Moisés aproveitou o período pré-conclave para se informar ao
máximo sobre o que estava acontecendo, sobre as explicações sugeridas
pelos especialistas e sobre os cardeais apontados como favoritos à
sucessão. “Li bastante sobre isso e, quando o cardeal argentino
Bergoglio foi anunciado como novo Papa, achei que o Espírito Santo tinha
dado um ‘olé’ em todo mundo, já que ele não figurava entre os
principais favoritos.” (RA)
Novo enfoque pastoral não muda a doutrina
Para o assessor
nacional da Comissão Episcopal Pastoral para a Vida e a Família, da
Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), padre Rafael
Fornasier, o grande diferencial do pontificado de papa Francisco tem
sido o enfoque pastoral para as questões mais delicadas relativas à
moral cristã, o que não representa de forma alguma uma mudança no
conteúdo da doutrina.
Segundo
o assessor, tal enfoque é fundamentado no princípio da “gradualidade”,
segundo o qual a vida cristã constituiu um caminho pessoal no
aprendizado do bem que se deve fazer e do
mal que se deve evitar, assim como o próprio conteúdo da fé, que é
assimilado gradualmente por cada pessoa. Então, ao abordar temas como o
dos casais de segunda união, o aborto ou a homossexualidade, o Papa não
pretende uma mudança de doutrina, mas sim de perspectiva: de um enfoque
casuístico e negativo em que se reforça o que todo mundo já sabe ser
errado, para um propositivo no qual primeiro se acolhe, depois se ensina
e se apresenta o que pode ser melhorado.
Padre Rafael
recordou, durante a entrevista para O SÃO PAULO, que, baseado
precisamente no princípio da gradualidade do caminho percorrido pelos
seres humanos, o papa Bento XVI, na entrevista “Luz do Mundo”, de Peter
Seewald, fala que “se um ‘prostituto´ usa um preservativo, isto pode ser
uma primeira atitude para uma moralização, um primeiro passo de
responsabilidade”. Assim, conclui que “quando Bento XVI considera o uso
do preservativo por pessoas que vivem uma situação de prostituição, que
já é um grande mal em si, não significa de forma alguma uma aprovação ou
um incentivo para que continue assim, mas uma perspectiva pastoral de
que, a médio e longo prazo, essas pessoas possam ser ajudadas”. (FG)
‘Comecei a ver a Igreja com a mente aberta’
O
pensamento do papa Bento XVI influencia as atitudes do papa Francisco na
condução da Igreja e deverá influenciar os pontificados dos próximos,
pelo menos, 200 anos. Essa é a avaliação do jornalista Gerson Camarotti,
da “Globo News”. O repórter acredita que só um homem com a capacidade
de reflexão do cardeal Ratzinger seria capaz de um gesto como o da
renúncia. “Ele é um profundo conhecedor da humanidade, da Igreja. Seu
legado é atemporal”, pondera Camarotti.
O repórter furou
bloqueios protocolares e se tornou o primeiro jornalista a conseguir uma
entrevista exclusiva com o papa Francisco, durante a participação do
pontífice na Jornada Mundial da Juventude (JMJ), na cidade do Rio de
Janeiro, em julho do ano passado. E sem fazer parte dos chamados Vatican
Accredited Media Personnel (“VAMPs”), grupo de jornalistas que viaja no
mesmo avião que o Papa e, em tese, tem prioridade na cobertura das
atividades do Pontífice. “Consegui a entrevista por meio da Igreja no
Brasil. O Papa perguntou ao meu contato se podia confiar e, diante do
sim da fonte, ele me chamou para a conversa. Foram incríveis 45
minutos!”, revela.
Adriana
Dias Lopes, editora da revista “Veja”, viajou a Roma para cobrir os
dias que se seguiram ao do anúncio da renúncia de Bento 16. Quando soube
da notícia, a jornalista estava na praia e imediatamente se comunicou
com seus superiores. “O clima era de agitação, que só se vê em grandes
acontecimentos históricos. As pessoas tinham mais perguntas do que respostas”, recordou.
“Na mesma semana,
veio a notícia da chefia de que eu iria para Roma com o correspondente
da revista em Paris, Mario Sabino. Só voltaríamos depois das eleições. A
ordem era ir o mais rápido possível. Embarquei dois dias depois.”
No total, Adriana
ficou 40 dias em Roma. “Minha função era cobrir menos o factual e mais o
clima da eleição papal – falar com teólogos e especialistas em
Vaticano.” Com essa missão, a jornalista da “Veja” conheceu os
principais veículos de comunicação católicos – segundo ela, “a maioria
excelente e ótima fonte de informação”. “Tornei-me uma profissional
melhor. Sob o ponto de vista jornalístico, comecei a ver a Igreja ‘com a
mente aberta’”, garante. (RA)
Papa Francisco tem sensibilidade pastoral
A grande
preocupação da Igreja sempre foi a evangelização. É o que ressalta o
eclesiólogo padre José Arnaldo Juliano dos Santos, ao analisar o início
do pontificado de Francisco. “Não podemos esperar um pontificado somente
para corrigir problemas internos. A missão maior da Igreja é a
evangelização. Tudo aquilo que pode atrapalhar esse objetivo, a Igreja
procura superar e seguir adiante”, afirma.
Nesse
aspecto, a doutora em Teologia Dogmática, irmã Vera Bombonatto,
acredita que a expressão “revolução de Francisco” parece um tanto
midiática. “Eu falaria mais da sensibilidade pastoral do papa Francisco.
Usaria critérios mais evangélicos.”
Do ponto de vista
doutrinal, Irmã Vera vê “uma continuidade linear muito grande”. Um sinal
muito forte da continuidade e do respeito ao pontificado predecessor,
segundo a teóloga, foi o gesto de assinar a encíclica Lumen Fidei,
praticamente toda escrita pelo papa Bento XVI. “Foi um gesto muito
grande. Se houvesse uma ruptura, Francisco não teria aceito e assinado
embaixo.”
De acordo com padre
Arnaldo, Bento XVI sempre foi um teólogo com um entendimento muito
profundo do que é o papado e sempre viu como um serviço e um
ministério. “É certo que a renúncia dele, mesmo que tomemos com bastante
surpresa, já estava anunciada de certa forma. Ele tinha consciência de
suas limitações físicas, não intelectuais, para fazer as reformas que já
estavam programadas.”
“Bento XVI
compreendeu a complexidade do momento histórico que vivemos, também
marcado pela pluralidade. Por isso, ele mesmo percebeu a necessidade de
alguém que soubesse se posicionar diante dessas duas características da
sociedade. E Francisco tem te mostrado alguém capaz de lidar com a
complexidade e a pluralidade do mundo”, completa irmã Vera.
Diante dos
escândalos de pedofilia envolvendo padres, o papa Franciso dá
continuidade ao caminho de enfrentamento dessa questão até então. Padre
José Arnaldo recorda que o próprio Ano Sacerdotal (2009-2010) instituído
por Bento XVI foi uma forma de chamar a atenção da Igreja para
santificação do clero. “Não podemos nos esquecer de que não só os 400
padres acusados de pedofilia foram demitidos do estado clerical no
pontificado de Bento XVI, como muitos padres foram investigados e punidos
no período de João Paulo II, quando o cardeal Ratzinger era prefeito da
Congregação para a Doutrina da Fé.”
Para
quem se lembra bem dos últimos sete papas, padre José Arnaldo alerta
que é preciso conhecer a dinamicidade da história da Igreja para
compreender como caminham os pontificados. “Não podemos entender bem o
papa Francisco sem voltarmos para a história da Igreja e seus
processos.” (FG)
Papa demonstra incrível confiança nos leigos
‘Ele nos atribui enorme autonomia e responsabilidade’, diz autora italiana
Tomar
iniciativa e não esperar pelos outros para evangelizar. Segundo a
professora Emilia Palladino, especialista em Doutrina Social da Igreja e
autora do livro “Leigos e Sociedade Contemporânea”, foi essa a mensagem
do papa Francisco para os fiéis leigos no seu primeiro ano de
pontificado. Em entrevista exclusiva ao O SÃO PAULO, ela afirmou que
Francisco tem uma “incrível confiança” nos leigos e lhes dá uma
“responsabilidade tão grande que até nos confunde”, avalia a italiana,
que ensina na Pontifícia Universidade Gregoriana de Roma.
“O
problema do laicato é importantíssimo, sobretudo na Itália. Temos uma
tradição cultural clerical. Não somos habituados, como leigos, a tanta
liberdade”, explica Palladino, que é casada e tem uma filha. “Mas
Francisco nos pede que não deixemos para os outros o peso e a vocação à
missão.” Segundo ela, o Papa sinaliza que os leigos não têm um papel
marginal na Igreja. “Para Francisco, a minha autonomia pastoral está no
fato de que sou uma pessoa que crê. Eu caminho na fé e por isso estou em
missão. E devo acompanhar o processo de crescimento de outras pessoas
na fé. Não é pouca coisa”, brinca. De acordo com a professora, a
mensagem deste Papa para os leigos é semelhante à de João Paulo II para a
juventude, quando dizia que o jovem é o evangelizador do jovem.
Mulheres
– Muito se questiona sobre o que o papa Francisco quis dizer quando, na
viagem de volta à Itália, após visitar o Brasil, afirmou que a Igreja
precisa de uma Teologia da Mulher. “Ele não foi preciso e ainda não
houve orientações”, reconhece a autora. “Mas, como mulher, tendo a
pensar que Francisco é mais próximo de mim do que outros papas do
passado. Isso não quer dizer que eu tenha resistências a Bento XVI ou a
João Paulo II. É uma questão de sensibilidade.
Por
outro lado, Francisco disse em diversas ocasiões que o papel da mulher
na Igreja deve estar diretamente ligado à figura de Maria. “Uma Igreja
sem as mulheres é como o colégio apostólico sem Maria”, declarou o Papa,
após a visita ao Rio de Janeiro. “O papel da mulher na Igreja não é
somente a maternidade, é mais forte. É exatamente o ícone da Virgem,
aquela que ajuda a Igreja a crescer. Nossa Senhora é mais importante que
os apóstolos! A Igreja é feminina: é Igreja, é esposa, é mãe”,
completou. Em outras ocasiões, ele reafirmou que o sacerdócio feminino
está fora de cogitação, como já haviam definido seus antecessores. “As
mulheres na Igreja precisam ser valorizadas, e não clericalizadas”,
resumiu Francisco certa vez, em entrevista ao jornal italiano “La
Stampa”.
De
qualquer forma, para Palladino ainda é cedo para cobrar mudanças deste
pontificado no tema das mulheres. “Não creio que seja o tempo, após
apenas um ano. Mas espero que ele nos escute. Espero que coloque ações
concretas em campo para escutar as mulheres”, diz, ponderando que o
“mundo feminino” é muito diversificado, de modo que seria necessário
ouvir várias vozes para se refletir bem sobre o papel da mulher na
Igreja.
Francisco é um ‘grande homem de governo’
“O Papa é um grande homem de governo”, avalia o padre Rocco D’Ambrosio, professor de Filosofia e Ética Política da Pontifícia Universidade Gregoriana de Roma, autor do livro “Como pensam e agem as instituições”. Ele faz parte de uma iniciativa de 15 professores que se uniram para publicar comentários sobre a exortação apostólica do papa Francisco, Evangelii Gaudium (“A Alegria do Evangelho”). A coletânea está prevista para maio, mas, em entrevista exclusiva ao O SÃO PAULO, padre D’Ambrosio adiantou suas impressões sobre o primeiro ano do pontificado. Para o professor, italiano de Bari, as experiências de Jorge Mario Bergoglio como superior provincial dos Jesuítas na época de ditadura argentina e como arcebispo de Buenos Aires por 15 anos foram grandes escolas para que aprendesse a conduzir a Igreja.
“É
um homem que estuda as situações, aprende a conhecer as pessoas e toma
decisões. Às vezes, decisões sofridas”, diz. “Não podemos esconder que a
fraqueza física do papa Bento 16, que o levou à renúncia, havia criado
certos problemas. Mas Francisco está buscando governá-los, e talvez isso
seja uma coisa que não aparece muito.”
Entretanto,
D’Ambrosio recomenda cautela quando se fazem comparações entre os
pontificados. “Para mim, tudo deve ser lido na linha da continuidade e
da descontinuidade. Existem coisas que estão em continuidade e existem
coisas que são descontínuas. Mas isso não é um juízo de mérito, de dizer
que um é melhor que o outro”, explica. Ele cita, por exemplo, os casos
dos papas Pio XII e João XXIII, ou Paulo VI e João Paulo II, que tinham
personalidades e estilos de governo completamente diferentes. “Podemos
até falar das diferenças entre Bento XVI e Francisco, mas temos que
observar elementos incompletos, porque a fase histórica não está
fechada.” Além disso, acrescenta, “cada um traz à vida da Igreja a
contribuição que considera útil”. Mesmo que haja descontinuidade de
estilo, “a fé é sempre a mesma”.
Por
sinal, o professor da Gregoriana avalia que o aspecto mais marcante
deste primeiro ano de Francisco é justamente o seu estilo pessoal. “Pelo
que pude entender, ele não mudou quando foi eleito. Tem sensibilidade
na abordagem, na aproximação com as pessoas, e um perfil comunicativo”,
resume. D’Ambrosio acredita que Francisco seja um grande comunicador,
mesmo sem querer. Isso ficou claro na entrevista que deu ao padre
jesuíta Antonio Spadaro, em setembro de 2012: “Eu consigo olhar as
pessoas individualmente, uma de cada vez, e entrar em contato de maneira
pessoal com quem está à minha frente. Não estou acostumado com as
massas”, revelou o Papa.
Quanto
ao conteúdo das mensagens do papa Francisco, D’Ambrosio entende que os
valores transmitidos estão todos no Evangelho e vêm sendo interpretados
pela Igreja ao longo da história. “Ele tem a capacidade de voltar ao
núcleo do Concílio Vaticano 2º”, avalia, referindo-se à grande reforma
realizada entre 1962 e 1965, iniciada sob João 23 e concluída no papado
de Paulo 6º. “A renovação eclesial, um novo impulso missionário, a
atenção aos problemas sociais... Quem aceita o Concílio, não rejeita
Francisco. Do ponto de vista doutrinal, este Papa é o Vaticano 2º.”
Comentários