Os Monges do mundo grego, sírio e
palestino souberam entre os séculos V e VIII desenvolver uma
espiritualidade mística e contemplativa profunda, posteriormente entre
os séculos XIII e XIV, apotegmas e obras de nomes como Evágrio Pôntico,
João Clímaco, Simeão o Novo Teólogo, Nicéforo, Gregório o Sinaíta,
Pacômio, Teodoro Estudita, Marcos o Eremita, e Elias o Écdico estavam
espalhadas por quase todo o oriente cristão.
A herança da reflexão ascética de Santo
Antão e de outros Padres do Deserto no oriente não se limitou aos
mosteiros, mais também há grandes teólogos, vários deles numerados entre
os “Padres da Igreja” assim como muitos outros autores bizantinos. Os
escritos destes homens foram muitos influentes na Igreja do oriente, a
contribuição deles em especial a preeminência da Escola Sinaítica que
desenvolve-se notavelmente nos séculos VI e VII principalmente quanto
hesicasmo, método de oração fundamentado na repetição infinita e na
apropriação interior do nome de Jesus. Técnica que com os monges do
Monte Athos será profundamente transmitida à Igreja durante o Império
Bizantino. A Salmodia e o uso das Escrituras foram grandes expressões da
vida dos Padres do Deserto e dos monges orientais.
O Monaquismo ocidental tomou um rumo
próprio e diferente como espiritualidade monástica quando comparado com
os autores místicos do oriente e a espiritualidade bizantina, as abadias
ocidentais tomaram das regras desenvolvidas por Santo Agostinho e São
Bento uma enorme difusão ao longo dos séculos, a espiritualidade destas
escolas oscilou no ocidente, mas apesar dos momentos em que passou a
espiritualidade ocidental, soube preservar uma teologia Ascética rica e
abertamente conciliável quando alinhada com a profunda oração, humildade
e ascetismo dos Padres monacais do oriente.
Os teóricos da oração, os grandes
hesicastas e mestres na Ascese no oriente, não são tão conhecidos no
Ocidente, talvez porque suas obras ou sentenças foram tardiamente
inseridas na literatura ocidental através de tratados e antologias
traduzidas ou copiladas em raríssimas edições durante a Idade Média.
A tradição monástica oriental floresceu a vida de muitos cristãos por anos e ainda hoje alimenta a vida das Igrejas orientais Sui Juris
em comunhão com o Papa ou as Igrejas ortodoxas separadas. Caminhos,
exercícios, formulas e métodos penduraram anos de dedicação na mente e
intelecto de homens e correntes de espiritualidade, “A oração do
coração” ou “Oração pura, sem distração”, “A invocação do nome de Jesus”
junto à clássica frase “Senhor Jesus Cristo, Filho de Deus, tende
piedade de mim”. Também ocupou e teve adesão de místicos no ocidente e
influencia nas técnicas jaculatórias. Sem falar na “Lembrança de Deus”
ou “Recordação de Deus” oriunda de São Basílio que ocupou a muitos
monges do oriente, são os sinais e expressões visíveis da riqueza da
espiritualidade oriental.
No século XVII fora publicada uma obra
que se tornara clássica para a vida e oração das Igrejas do oriente a
“Filocalia” que veio a reunir diversos autores, textos e sentenças
espirituais dos Padres da Igreja e monges bizantinos. Trago abaixo
citações desta obra que fora traduzida também para a língua portuguesa e
tem obtido um verdadeiro interesse do Ocidente nos últimos séculos.
“Não poderias possuir a oração pura,
estando perturbado com coisas materiais e agitado por inquietações
contínuas, pois a oração é abandono dos pensamentos”. (p. 23, nº 70 Evángrio Pôntico).
“Nossa oração não deve começar por
nenhuma convenção nem hábito: atitude corporal, silêncio, genuflexão.
Devemos vigiar com atenciosa sobriedade o nosso espírito, esperando o
momento em que Deus se apresente, visite a alma através de todas as
passagens, atalhos e sentidos. Só é preciso calar-se, gritar e orar com
clamores, quando o espírito está solidamente ligado a Deus. A alma deve
despojar-se inteiramente, para a súplica e o amor de Cristo, sem
distração, nem divagação de pensamentos”. (p. 31, Macário, o Grande).
“Se, portanto, começarmos a cumprir com
fervor dos mandamentos de Deus, a graça logo iluminará nossos sentidos
com um sentimento muito profundo; consumirá, por assim dizer, nossos
pensamentos, suavizará nosso coração pela paz de uma inexprimível
amizade, e dar-nos-á a disposição para pensar coisas espirituais e não
mais carnais. É o que acontece continuamente com os que se aproximam da
perfeição e guardam no coração, ininterrupta, a lembrança de Jesus.” (p.
47, Diádoco de Fótico).
“A lembrança de Deus é um labor do
coração, suportado pela fé. Quem quer que esqueça Deus, torna-se amigo
da paixão e insensível.” (p. 52, nº 122, Marcos, o Eremita).
“O coração de quem examina a própria
alma a todo instante goza das revelações. Quem recolhe a contemplação no
interior de si mesmo, contempla o brilho do Espírito; quem desprezou a
dissipação, contempla o seu Senhor dentro do próprio coração”. (p. 59, Issac de Nínive (S. Isaac, o Sírio).
Citações de nomes que podem ser
desconhecidos para os ouvidos de milhares de ocidentais e até bons
católicos, no entanto a vida e obra destes homens contribuíram
fortemente com a espiritualidade cristã. O estudo e a reflexão de suas
obras são úteis aos cristãos que desejam deparar-se com uma ortodoxa
espiritualidade nascida no seio da Igreja Católica.
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