Com a Quaresma, no Brasil passamos a viver também o tempo da Campanha da Fraternidade. É uma maneira dos cristãos examinarem a sua vida batismal iluminados por um aspecto social que nos atinge a todos. O tema interessa a toda humanidade – é uma ocasião propícia para olharmos a nossa vida e descobrirmos a nossa missão diante da responsabilidade desse assunto.
O tema da “fraternidade e a vida no planeta” questiona a nossa vida e nossas opções quando verificamos que “a criação geme em dores de parto” (Rom 8,22), supondo a coragem de acolhermos o chamado à conversão para uma vida mais sóbria e humana.
Para os católicos, o tema irá inspirar todos os demais, principalmente os dias e meses temáticos deste ano, ajudando-nos a continuar aprofundando o assunto através de diversos matizes. Também ele continuará a ser trabalhado com a pastoral da ecologia ou outro nome que se assemelhe, passando assim a integrar as preocupações da Igreja.
As reflexões que fazemos supõem que cheguemos a conclusões que impliquem não só mudança de mentalidade, mas, principalmente, mudança de atitudes e comportamentos. E com relação ao tema deste ano, urge que isso aconteça com certa rapidez, pois as mudanças que ora ocorrem na natureza estão levando nosso planeta a “gemer” e fazem com que também os seus habitantes sofram como consequência de seus próprios atos.
Assim, o tempo da Quaresma, ao nos chamar a renovar nossa vida batismal e por isso supondo mudanças na vida pessoal, religiosa, familiar, comunitária e social, coloca para nós um tema que supõe também uma mudança de mentalidade e, consequentemente, chama-nos também à conversão.
Incentivo todos os queridos diocesanos para que aproveitem este tempo para a oração, jejum, esmola, penitência, lectio divina, confissão, participação nas comunidades e as reuniões de grupos, círculos bíblicos ou pequenas comunidades com o texto elaborado pela arquidiocese sobre a Quaresma e a Campanha da Fraternidade.
Vivemos em uma cidade maravilhosa, onde a natureza exuberante rodeia as construções feitas pelos homens. Porém, a beleza das flores, o encanto das madrugadas e das noites serenas, o belo nascer e pôr do sol, o trinar dos pássaros e o encanto da nossa vida podem estar sendo engolidos por uma onda de destruição sem limites, numa volúpia do ganho sem medida, do prazer descontrolado, da falta de consciência do pecado, que, como já dizia Pio XII, é o maior mal dos dias atuais.
Temos também que ter o olhar na dignidade das pessoas e em suas necessidades urgentes que muitas vezes levam-nas a procurar caminhos que as colocam em risco de vida própria e dos outros. Necessitamos sonhar com tempos melhores.
O pecado do homem, ensina-nos a Sagrada Escritura, destruiu a harmonia da criação. E o pecado, presente nos dias de hoje com recursos incomensuráveis da ciência e da técnica tem um poder de destruição ainda maior.
Na abertura desta Quaresma, o S. Padre, o Papa Bento XVI, nos diz: “No nosso caminho encontramo-nos perante a tentação do ter, da avidez do dinheiro, que insidia a primazia de Deus na nossa vida. A cupidez da posse provoca violência, prevaricação e morte... A idolatria dos bens, ao contrário, não só afasta do outro, mas despoja o homem, torna-o infeliz, engana-o, ilude-o sem realizar aquilo que promete, porque coloca as coisas materiais no lugar de Deus, única fonte da vida. Como compreender a bondade paterna de Deus se o coração está cheio de si e dos próprios projetos, com os quais nos iludimos de poder garantir o futuro?”
A Quaresma, na Igreja, foi sempre um tempo penitencial de preparação para uma vida nova, marcada pela Paixão e Ressurreição de Cristo que venceu a morte e, ressuscitado, já não morre mais e marca na fronte todos os que Nele creem. Batizados na morte de Cristo, somos o novo homem, de que toda a natureza espera também o renascimento, segundo nos ensina São Paulo no texto que culmina com o lema da Campanha da Fraternidade neste ano: “A criação em expectativa anseia pela revelação dos filhos de Deus....Pois sabemos que a criação inteira geme e sofre as dores de parto até o presente.”
Neste sentido, a Igreja do Brasil escolheu um tema em que o pecado social se manifesta com presença forte em nosso tempo, numa avidez do lucro, do enriquecimento sem controle, violentando a natureza.
A poluição das águas, o represamento irracional de rios, lixões situados em locais de aquíferos importantes, o desmatamento irracional das florestas, a falta de saneamento básico nas cidades, a dificuldade de possuir moradias dignas que leva pessoas a construírem em lugares de risco, a não existência de um plano diretor que contemple a realidade urbana honestamente, sem interesses escusos, a ausência de educação para uma coleta seletiva do lixo, a falta de utilização de recipientes degradáveis e tantas outras situações locais, nacionais ou mundiais (países que poluem e pouco se importam com outros) nos questionam sobre os desastres ambientais: a morte de tantos irmãos e irmãs, o aquecimento global, a diminuição das geleiras dos pólos, o aumento do nível dos oceanos e as doenças antigas que retornam e adoecem o nosso povo.
Como cristãos, vamos meditar sobre a realidade desse pecado social de que todos participamos. Peçamos perdão por nós e pelos outros. Tentemos reedificar nossa vida ouvindo os gritos de dor da criação, manifestados nas grandes tragédias a que estamos assistindo, cada dia com mais frequência, inclusive com a perda de vida de nossos irmãos, obrigados que são a agredir a natureza por sua miséria nas favelas e nos morros.
Esse planeta é o nosso habitat. Não existe outro local, até agora conhecido, possível de habitarmos. Por isso, a Campanha da Fraternidade nos direciona para a conscientização sobre a sustentabilidade com o Reduzir, Reutilizar, Recuperar, Reciclar, Repensar. O que poderemos fazer pessoalmente e em nossas famílias com relação a essa realidade? O que e como poderemos cobrar leis e atitudes de nossos municípios, estados e nação?
A Campanha da Fraternidade é um meio de nos inserirmos no mistério de Cristo Redentor, com a atenção voltada a um campo específico, em espírito penitencial que nos leve a viver com consciência o nosso batismo, a viver uma vida de fé na esperança da redenção.
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