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«Desafios éticos do trabalho humano»

Mensagem da Conferência Episcopal Portuguesa

1. Um dos problemas mais graves que hoje atingem o nosso País diz respeito à situação do mundo do trabalho. Para muitos, o problema consiste no desemprego; para outros, no trabalho precário ou mal remunerado; para outros ainda, tem sido a necessidade de cargas suplementares de esforço na procura da sobrevivência das suas empresas. Sobressai a elevada taxa de desemprego dos jovens, muitos dos quais escolheram a emigração como forma de obterem o que não encontram no seu País. Também muitas pessoas de meia-idade vivem situações complicadas de adaptação laboral num período repleto de encargos econômicos, devendo merecer uma solicitude particular por parte da sociedade e do Estado.
Muitos outros têm também sido duramente atingidos pela crise e pelas medidas tomadas para a combater. Neste contexto, entendemos ser particularmente oportuno afirmar a mensagem nuclear da Igreja sobre o trabalho humano.

Direito e dever do trabalho
2. Como afirmou o Papa João Paulo II, na sua encíclica sobre o trabalho humano: «A Igreja está convencida de que o trabalho constitui uma dimensão fundamental da existência do homem sobre a terra»[1], não apenas enquanto meio de sustento, mas também enquanto atividade inerente ao processo de desenvolvimento de cada pessoa e da sociedade. De acordo com esta visão humanista, o trabalho constitui um direito e um dever, decorrentes da natureza humana e da sua inviolável dignidade; para os cristãos decorre também do facto de todo o ser humano, homem ou mulher, ser «imagem de Deus»[2], um Deus ativo e criador.
Quando a Igreja fala em dignidade humana refere-se, antes de mais, a uma qualidade inerente à própria natureza humana, que implica a consideração do homem e da mulher como seres livres, dotados de subjetividade, inteligência, vontade e criatividade; bem como de capacidade para decidir e assumir responsabilidades e relacionar-se com os outros, realizando-se a si próprios. Deste modo, o trabalho deverá permitir a todos o exercício efetivo daquelas qualidades e potencialidades.
Neste entendimento, não é qualquer trabalho que satisfaz as exigências da dignidade humana. Daí, também, nas palavras do Papa João Paulo II, a «obrigação moral de unir a laboriosidade como virtude com a ordem social do trabalho, o que há de permitir ao homem tornar-se mais homem no trabalho, e não já degradar-se por causa do trabalho»[3].
O Papa Francisco sublinhou, recentemente, que importa «voltar a colocar no centro a pessoa e o trabalho. A crise económica tem uma dimensão europeia global; no entanto, a crise não é apenas econômica, mas também ética, espiritual e humana. Na raiz existe uma traição ao bem comum, quer da parte do indivíduo, quer da parte de certos grupos de poder. Por conseguinte, é necessário tirar a centralidade à lei do lucro e do rendimento, e voltar a dar a prioridade à pessoa e ao bem comum»[4].

O drama do desemprego
3. A situação do país em matéria laboral é, em muitos aspectos, grave e de difícil solução. Vêm a propósito as palavras do Papa Bento XVI: «Em muitos casos os pobres são o resultado da violação da dignidade do trabalho humano seja porque as suas possibilidades são limitadas (desemprego e subemprego), seja porque são desvalorizados os direitos que dele brotam, especialmente o direito ao justo salário, à segurança da pessoa do trabalhador e da sua família»[5]. Entre as situações mais graves está a dos desempregados que não têm direito a qualquer forma de subsídio de desemprego. Importa recordar que essa forma de apoio está ligada ao direito à vida e à subsistência, e decorre não só da dignidade humana mas também do princípio do uso comum dos bens, tanto mais imperativo quanto mais grave seja a situação geral do País.
Conseguir compatibilizar esta obrigação de solidariedade social com a diminuição efetiva da riqueza pessoal e do próprio País é um enorme desafio que se coloca a todos os cidadãos.
Pese embora o imenso esforço de muitas empresas de se reinventarem e de procurarem novos mercados para os seus produtos capazes de assegurarem o seu futuro e dos seus colaboradores, não pode passar despercebida a tendência para promover o emprego através do cerceamento dos direitos dos trabalhadores. Sem querer entrar no domínio das medidas concretas, não podemos deixar de sublinhar, uma vez mais, que «o trabalho é para o homem e não o homem para o trabalho»[6]. Seria contraditória, em si mesma, qualquer medida que procurasse promover o emprego à custa de outras dimensões da dignidade humana. Assim, recordou o Papa Francisco num encontro com os trabalhadores: «No centro deve estar o homem e a mulher, como Deus deseja, e não o dinheiro»[7]. A dignidade do capital está no serviço das pessoas e na promoção do seu progresso.

Potenciar as empresas para promover o trabalho
4. Constatamos que a “empresa” é um dos elementos fundamentais da problemática do trabalho e um eixo central na luta contra a pobreza e o desemprego. As empresas são feitas de pessoas e há empresas onde o único valor parece ser o lucro, desprezando os valores humanos e sociais, e há empresas onde o valor da pessoa humana é central, contribuindo para o crescimento integral de cada um dos seus colaboradores. São as pessoas que colaboram numa empresa, e a sua equipa dirigente e acionistas em particular, que determinam o comportamento da empresa, os seus valores e as suas práticas.
Importante é promover uma cultura de justiça que dignifique empregadores e trabalhadores, que se concretiza pagando atempadamente a quem trabalha, o que contribui também para promover o emprego.
É essencial desafiar cada cristão a viver com sentido de missão o seu trabalho profissional, a procurar assumir os critérios de Cristo na sua empresa, traduzindo-os na realidade das tarefas, na promoção de boas-práticas que potenciem o desenvolvimento da empresa, a procura da qualidade e a dignidade de cada colaborador.


Criatividade nas soluções
5. É sabido que os problemas de emprego requerem soluções difíceis. As soluções necessárias têm dimensões que ultrapassam as características deste documento. Todavia, sempre dentro de preocupações fundamentalmente éticas, não queremos deixar de propor algumas orientações no âmbito de um breve quadro de referência básico.
Recordemos, antes do mais, que todos somos chamados a contribuir para a resolução dos problemas do desemprego e do emprego precário, com partilha de responsabilidades entre os poderes públicos, centrais e autárquicos, as empresas, os parceiros sociais, as organizações não lucrativas, as famílias e as pessoas individualmente consideradas. Estão em causa um direito humano e um aspecto fundamental do bem comum, que requerem uma maior sensibilidade social e mais fortes laços de solidariedade, que levam à corresponsabilização pelos que estão em piores condições.
Impõe-se que a aproximação da oferta e da procura de emprego não fique totalmente dependente dos mecanismos do mercado. A nível global, são necessárias e urgentes políticas favoráveis a um modelo de crescimento econômico que potencie a ação das empresas (com ou sem fins lucrativos) e instituições para que estas possam criar empregos de qualidade. Nisto está o verdadeiro motor do aumento de empregos. Neste âmbito, colocam-se exigências particularmente relevantes às políticas europeias relacionadas com o emprego. No mundo globalizado em que vivemos, tal esforço implica também uma dimensão internacional.
Para fazer face ao desemprego, os países europeus, entre os quais o nosso, têm também lançado mão das chamadas «políticas ativas de emprego», com resultados insatisfatórios. Todavia, sobretudo quando incluem uma adequada componente formativa e qualificante, podem ser importantes num contexto geral de baixas qualificações dos trabalhadores e dos empresários.

Realismo e esperança
6. Recordamos as palavras do Papa Bento XVI, chamando a atenção para a necessidade de «um mercado, no qual possam operar, livremente e em condições de igual oportunidade, empresas que persigam fins institucionais diversos». Por outras palavras: «Ao lado da empresa privada orientada para o lucro e dos vários tipos de empresa pública, devem poder-se radicar e exprimir as organizações produtivas que perseguem fins mutualistas e sociais»[8].
Queremos manifestar a nossa profunda solidariedade e proximidade com os que não encontram trabalho e vivem situações de angústia. Louvamos e agradecemos os que investem em tempos de crise para criar postos de trabalho e manter as portas da sua empresa abertas, por vezes com grande sacrifício.
A gravidade do problema é um urgente apelo à criatividade e à excelência profissional de trabalhadores e empresários, de governantes e forças sociais e políticas, na procura de novas propostas e paradigmas que se tornem progressivas soluções para os variadíssimos problemas que emergem no campo do trabalho humano. Com realismo e esperança.

Fátima, 14 de novembro de 2013

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